A Disney está prestes a completar um marco de 100 anos em outubro deste ano, mantendo sua posição como o império midiático dominante da atualidade, com marcas amplamente reconhecidas como Pixar, Marvel e Lucasfilm sob seu controle. No entanto, é notável como o estúdio evoluiu ao longo dos anos, adaptando-se às sensibilidades contemporâneas e abandonando representações problemáticas presentes em suas animações clássicas.
Antigamente consideradas normais, algumas abordagens dos filmes clássicos da Disney certamente seriam rejeitadas se fossem lançadas nos dias de hoje. Esse movimento de rejeição, embora elimine estereótipos prejudiciais, também sugere uma mudança na criatividade e ousadia do estúdio, que parece seguir uma abordagem mais segura e convencional em suas produções recentes.
A evolução dos padrões culturais e sociais reflete a mudança de perspectiva na indústria do entretenimento, destacando a importância da representatividade e da sensibilidade. A Disney, ao se adaptar a essas transformações, molda-se como uma empresa que busca se manter relevante e respeitosa em um mundo em constante mudança.
A Evolução da Representação do Tabagismo nos Filmes da Disney
Durante anos, e não apenas na Disney, como também no mundo todo, os **cigarros**, **charutos** e fumos eram vistos como um **sinal de status social** e até beleza. Por anos, o próprio estúdio tentou desvincular essa ideia, colocando **cigarros** na boca de personagens que faziam coisas erradas (Pinóquio) ou até mesmo de vilões (Cruela de 101 Dálmatas, por exemplo).
No entanto, de uns tempos para cá, a Disney tenta a todo custo **desvincular** o uso de **cigarros** e **charutos** de seus filmes, motivo pelo qual, no filme solo de Cruella, nunca temos uma cena sequer da personagem dando uns tragos. Muito disso cai numa **política do cinema americano**, que evita a todo custo propagandear e aludir o tabagismo em suas obras “para toda a família”.
A Disney: do psicodélico ao realista
A representação de temas relacionados a drogas psicotrópicas sempre foi um terreno nebuloso nos filmes da Disney. O clássico Dumbo, por exemplo, possui uma longa sequência de alucinação que ecoa pela mente dos espectadores. Da mesma forma, Alice no País das Maravilhas é interpretado por muitos como uma extensa viagem lisérgica pelos reinos da fantasia.
Com as sensibilidades contemporâneas em mente, a Disney tem optado por se distanciar de qualquer conteúdo que possa parecer levemente “chapado demais”. Isso fica evidente nas versões live-action de Dumbo e Alice no País das Maravilhas, que perderam o tom mais psicodélico de suas narrativas animadas. Os novos filmes buscam por um realismo e uma coesão textual que não se faziam presentes nas obras originais, tudo isso para evitar qualquer associação com drogas psicotrópicas.
A Controvérsia nas Representações de Povos Indígenas nos Filmes da Disney
Lançado nos anos 90, Pocahontas marcou um momento que se transformaria em uma situação delicada para a Disney. Apesar das belas canções e da animação primorosa, o filme foi alvo de debates acalorados devido à forma como a narrativa foi construída a partir da história real de uma criança indígena sequestrada, violentada e submetida aos horrores da colonização. Muitos questionaram como o estúdio conseguiu transformar essa realidade em uma simples “história de princesa” sem abordar a complexidade e brutalidade dos eventos reais.
Não foi apenas em Pocahontas que os estereótipos racistas contra povos nativos e indígenas foram evidenciados. Filmes como Peter Pan também foram criticados pela representação simplista e carregada de preconceitos em relação aos nativos americanos. Essas críticas levaram a uma reflexão interna no estúdio e possivelmente são responsáveis pela ausência de planos para um remake live-action de Pocahontas.
Essas discussões revelam a necessidade de uma abordagem mais sensível e respeitosa em relação às representações de povos indígenas no cinema e na mídia em geral. É fundamental reconhecer a diversidade, as culturas e as histórias desses povos, evitando a perpetuação de estereótipos e a romantização de passados violentos e traumáticos. O papel da Disney e de outros estúdios de entretenimento é crucial nesse processo de transformação e conscientização.
A Disney e a Representação das Culturas Asiáticas
Além das representações de povos nativos americanos, a Disney enfrentou críticas por suas interpretações de culturas asiáticas. O filme Mulan, considerado um clássico do estúdio, recebeu reações negativas na China devido a Mushu, caracterizado como uma representação desrespeitosa de um símbolo sagrado.
Nos últimos anos, a empresa tem se dedicado a criar representações mais autênticas e menos estereotipadas das culturas asiáticas. Isso se deve em parte à importância do mercado chinês, que é uma grande fonte de receita para os filmes da Disney, e também para criar conexões mais genuínas com o público ásio-americano. O remake de Mulan, por exemplo, passou por diversas mudanças para se adequar a essas novas diretrizes.
Assim, a Disney está realizando esforços para promover uma representação mais respeitosa e autêntica das culturas asiáticas em suas produções. Essa mudança visa não apenas evitar polêmicas como as geradas por Mushu em Mulan, mas também criar histórias que ressoem de forma positiva com diversas audiências ao redor do mundo.
A Conscientização sobre Representatividade Negra nos Filmes da Disney
A Disney tem um histórico de representações racistas em suas produções, com caricaturas ofensivas de pessoas negras presentes em filmes clássicos. Recentemente, o estúdio tem buscado corrigir esses erros e censurou cenas problemáticas em obras como Peter Pan e Dumbo no Disney+, o serviço de streaming da empresa.
Embora no passado tenham sido comuns estereótipos raciais em suas animações, a Disney tem feito esforços para mudar essa realidade. Críticas foram feitas sobre a pouca representatividade de personagens negros e negras em seus filmes, como visto em produções como A Princesa e o Sapo e Soul.
Hoje, ainda há discussões sobre como as personagens negras não recebem o devido destaque nas produções da Disney, apesar das mudanças visíveis. É importante continuar questionando e debatendo essas questões para garantir uma representação mais autêntica e respeitosa no universo da animação.
A Evolução dos Papéis de Gênero no Cinema: Desconstruindo os Estereótipos das Donzelas Indefesas
Nos últimos anos, temos passado por uma significativa mudança cultural em relação aos **papéis de gênero** na sociedade. O que era comum e aceitável há noventa anos já não está mais em voga, e a **participação feminina** dentro e fora das câmeras tem ganhado cada vez mais destaque. Por isso, a ideia das “donzelas indefesas” caiu completamente de moda.
Se antes víamos princesas delicadas, ameaçadas e com pouca agência sendo feitas de moeda de troca nos **embates** de príncipes e vilões, agora temos uma boa **mudança de papel**, que pode ser perfeitamente capturada em filmes como Frozen, Enrolados e até mesmo Detona Ralph. Agora, todas as personas femininas
A Representação dos Personagens Masculinos nos Filmes da Disney
Em contrapartida, a Disney também tem puxado o freio na visão idealizada destinada aos seus personagens masculinos. Se, nos filmes das princesas, os Príncipes sempre eram vistos como figuras perfeitas, imbatíveis e capazes de salvar a donzela indefesa, nos últimos anos temos uma abordagem mais igualitária e, eu diria, até mesmo humanizada.
Filmes como Enrolados, Detona Ralph e Frozen preferem focar em homens bons e gentis que podem ser um pouco atrapalhados, enquanto os remakes live-action do estúdio, como A Pequena Sereia, Aladdin e até mesmo Cinderela mostram essa nova abordagem.
A evolução da representatividade LGBTQIA+ nos vilões da Disney
Por décadas, a Disney fez uso do queercoding ao retratar personagens como **Úrsula**, **Scar**, **Hades** e **Malévola**, atribuindo a eles signos, símbolos e trejeitos que os identificavam como queer, ou LGBTQIA+. Essa prática, no entanto, era frequentemente associada aos vilões das histórias, reforçando estereótipos e preconceitos.
Nos últimos anos, diante do crescente debate sobre representatividade positiva das minorias, a Disney parece ter adotado uma postura mais comedida em relação a essas representações. Ainda assim, a representatividade LGBTQIA+ oferecida nos filmes da empresa ainda está longe do ideal, com a introdução de inúmeros “primeiros personagens gays da Disney” que, muitas vezes, carecem de profundidade e autenticidade.
É importante destacar que, embora a Disney tenha diminuído a presença do queercoding em seus vilões, o caminho em direção a uma representatividade mais genuína e significativa para a comunidade LGBTQIA+ ainda requer avanços significativos. A inclusão destas minorias de forma autêntica e respeitosa é fundamental para que todas as pessoas se vejam representadas e valorizadas nas narrativas cinematográficas e culturais.
A ousadia da Disney: da Era Experimental ao retorno à tradição
Ao longo de sua história, a Disney sempre esteve disposta a brincar com os gêneros e possibilidades dentro da criação artística, o que levou a filmes bem bizarros e pouco ortodoxos, como Fantasia, que mescla cenas animadas e uma boa dose de música clássica.
No começo dos anos 2000, o estúdio se entregou naquilo que se considerava sua “Era Experimental“. No entanto, o fracasso comercial de títulos como O Galinho Chicken Little, Planeta do Tesouro e Atlantis: O Reino Perdido fez com que o estúdio se afastasse cada vez mais desses projetos ousados, optando pela abordagem mais tradicional de suas narrativas e estilos de animação.
Atualmente, é muito pou
provável
que a Disney retome sua ousadia anterior e se aventure novamente em projetos que desafiem as expectativas do público. No entanto, a tradição e o sucesso de suas produções mais convencionais indicam que a empresa está confortável em seguir um caminho mais seguro e previsível.
A Mudança de Enfoque da Walt Disney Animation Studios
Durante muitas décadas, a Walt Disney Animation Studios levou a sério um ideal de “histórias originais”, motivo pelo qual o estúdio nunca produziu sequências e continuações para seus maiores clássicos, em vez disso, todo o trabalho de produzir continuações vinha de estúdios menores da Disney, e os lançamentos eram feitos direto para VHS e DVD.
Isso tem mudado consideravelmente ao longo da última década, graças ao lançamento de filmes como Frozen II e WiFi Ralph, o que mostra como o estúdio agora está mais focado no lucro de propriedades intelectuais já estabelecidas e, dado o fracasso de alguns projetos originais, tal como os novos filmes da Pixar, é bem provável que vejamos mais sequências sendo produzidas pela própria Animation Studios.
Jornalista cinéfilo e viciado em filmes e séries, mergulhando de cabeça no mundo geek. Com críticas cativantes e análises perspicazes, compartilha sua paixão e conhecimento, tornando a cultura pop mais envolvente.